segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

GM E O SEU PUXADÃO


Sem espaço para crescer, GM faz 'puxadão'

Fábrica de São Caetano recebe produção extra de 2 novos carros, antes prevista para São José, onde não houve acordo com o sindicato

CLEIDE SILVA - O Estado de S.Paulo


O galpão antes usado como depósito de peças abriga agora uma linha de montagem dos modelos Cobalt, Cruze e Spin. Uma enorme cratera no meio da fábrica indica que obras de ampliação seguem em ritmo acelerado. A fábrica da General Motors em São Caetano do Sul, no ABC paulista, funciona 24 horas de segunda a sexta-feira e ainda há jornadas extras em dois sábados ao mês.
Em contrapartida, a filial de São José dos Campos, no Vale do Paraíba, opera com 80% de ociosidade na área de automóveis e os trabalhadores tentam evitar o corte de 1,4 mil vagas, metade delas prevista para março.
A falta de entendimento entre a direção da GM e o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos para a adoção de medidas de flexibilidade nas relações de trabalho tirou daquela fábrica pelo menos R$ 1,5 bilhão em investimentos na produção de dois novos carros, o sedã Cobalt e o monovolume Spin, lançados nos últimos 15 meses.
Os dois projetos foram transferidos para o ABC, que precisou de complexa reformulação para abrigar as novas linhas, além de contratar 1,5 mil funcionários para um terceiro turno que funciona de madrugada.
O complexo, inaugurado há 84 anos numa área rural, hoje está encurralado no centro da cidade de 150 mil habitantes e não tem como expandir em área. A solução foi recorrer a puxadinhos (e puxadões) que possibilitaram ampliar a capacidade produtiva em 60 mil carros ao ano, o dobro do que fará a fábrica da BMW em construção em Santa Catarina.
A unidade produz cerca de 25 mil veículos ao mês de seis modelos: Cobalt, Spin, Montana, Classic e Cruze nas versões hatch e sedã - número que poucas montadoras conseguem atingir em uma mesma fábrica. Em São José, são 3,2 mil unidades mensais do Classic, em um turno de trabalho. Há um ano, a linha, chamada de MVA, produzia de 15 mil a 18 mil carros por mês, incluindo Corsa, Meriva e Zafira, retirados do mercado em 2012.
"A decisão de colocar o Cobalt e a Spin em São Caetano foi claramente por falta de acordo com o sindicato de São José", diz Jaime Ardila, presidente da GM América do Sul e do Brasil. Sem novos projetos, o MVA deve ser fechado, o que pode resultar na demissão de 650 funcionários que estão em lay-off (contratos suspensos) desde agosto e de outros 750 da linha do Classic, que será descontinuada em janeiro.
Fórmulas. Com a decisão de transferir para São Caetano os projetos antes destinados ao Vale, coube a José Eugênio Pinheiro, vice-presidente de manufatura da GM América do Sul encontrar fórmulas para instalar a nova linha, com mais prensas e robôs, sem contar com espaço físico extra. "Vivemos um período sem precedência em toda a história da GM no Brasil", ressalta Pinheiro. "Em nove meses, preparamos a fábrica para parir quatro produtos", diz ele, referindo-se às duas versões do Cruze, Cobalt e Spin. As obras, segundo ele, foram feitas praticamente sem parar a produção dos modelos mais antigos.
Para promover as mudanças que resultaram na ampliação da capacidade produtiva de 210 mil para 270 mil veículos ao ano, as atividades foram suspensas por duas semanas em 2011 e duas em 2012. A maior parte do serviço foi feita em paralelo à produção normal, nos fins de semana e feriados. Para ampliar a capacidade de 280 mil para 380 mil carros anuais, a Renault parou por dois meses (dezembro e janeiro).
Uma das soluções foi transformar o galpão de estoque de painéis em uma linha de montagem flexível que produz os três modelos mais jovens da gama. As peças agora estão espalhadas em diferentes espaços da fábrica, aguardando o fim das obras de renovação de um antigo armazém. Previsto para outubro, vai custar R$ 15 milhões.
A linha recebeu 158 novos robôs para solda e 4 para pintura. Um outro robô, apelidado de Huck e considerado o maior desse tipo na América Latina, foi especialmente desenvolvido para executar a função de girar os carros suspensos em uma área em que a operação não seria possível de ser realizada no solo em razão do pouco espaço. Com rearranjos e "ocupação inteligente", a fábrica ganhou 16 mil m² de área construída, somando agora 322 mil m². Nove linhas antigas de prensa foram substituídas por uma moderna, com maior capacidade. A cratera que se vê no meio da fábrica é para a instalação de uma segunda prensa.
Aos 64 anos, Pinheiro, que foi responsável pela construção da fábrica de Gravataí (RS) com inédito sistema modular de produção, diz que a reforma de São Caetano foi o maior desafio de sua carreira de 45 anos de GM. "A transformação foi gigantesca."
Paralelamente às obras no ABC, ele coordenou a ampliação da fábrica gaúcha, que em abril passa a operar em três turnos, ampliando a capacidade mensal de 22 mil para até 32 mil unidades e ainda a construção da filial de motores em Joinville (SC), a ser inaugurada nesta semana.
Para o presidente do Lean Institute Brasil e estudioso do setor automobilístico, José Roberto Ferro, a urgência da GM em preparar a unidade de São Caetano "foi ótima oportunidade para buscar maior eficiência". Em sua opinião, a montadora era "acomodada" e as mudanças que ajudaram a ampliar a capacidade "mostram que havia oportunidades de melhoria na fábrica".

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